Em matéria recentemente publicada por
um jornal de grande circulação de Fortaleza, a manchete alertava para os
supostos riscos à saúde causados pelo consumo de cerveja feita a partir de milho transgênico.
No decorrer da matéria, uma entrevista realizada com uma nutricionista passava a
informação de que o consumo de transgênicos seria responsável pelo crescimento de
alergias no mundo, bem como pelo aumento na incidência de câncer no fígado. Mas
seriam os transgênicos responsáveis por isso?
Devido à falta de fontes na
matéria, é necessária uma pesquisa para avaliar a veracidade do que foi
afirmado. Com uma busca rápida é possível encontrar estudos, revisões e
levantamentos relacionados ao tema. Um desses levantamentos, publicado em um
artigo de revisão da Critical Reviews in
Biotechnology, trouxe uma análise de quase 1800 artigos publicados na
década de 2000 relacionados aos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs),
que incluem os transgênicos. Em nenhum desses artigos foi encontrada evidência
de efeito adverso causado pelo consumo de alimentos transgênicos.
Além deste, um relatório
divulgado pela União Europeia (UE) trouxe os dados relacionados ao uso e consumo de
transgênicos na Europa. A UE tem os padrões mais rígidos estabelecidos para
aprovação de um alimento transgênico. Diversos programas foram criados para
analisar desde a produção até o pós mercado desse tipo de alimento. Esses programas
fazem uso de técnicas como o prolifing e
as ômicas, que incluem metabolômica,
transcriptômica e proteômica, para analisar, por exemplo, a toxicidade dos
alimentos transgênicos, ou mesmo a detecção de culturas transgênicas. Em nenhum
dos testes destes programas foi detectado efeito adverso também.
Com relação às alergias, é
importante salientar que um produto modificado geneticamente não causa alergia
pelo simples fato da modificação. Para explicar, é importante lembrar o que é de
fato a transgenia. Ela é a introdução de um gene de outra espécie, que irá
produzir uma proteína de interesse no alimento. Essa proteína pode vir a ser
alergênica, sim. Porém, para evitar esse tipo de inconveniente, são realizadas
comparações dos genes de proteínas reconhecidamente alergênicas com a da
proteína de interesse. Se não apresentarem semelhanças, a proteína de interesse
passa para os próximos passos de testes. Estes são necessários, pois só a
análise dos genes ainda não é suficiente para concluir a avaliação. Vários são
os testes que dão sequência à avaliação, e eles seguem até a garantia da total
segurança para a liberação da proteína.
Dessa forma, é de se notar que os
transgênicos são uma das variedades de alimentos que mais passam por testes no
mundo. Seria difícil, então, que fosse liberada um transgênico alergênico. De
fato, o mais provável é que os OGMs passem a ser usados como ferramentas para
combater os efeitos da alergia. Isso, de acordo com um artigo publicado pela
Universidade de Harvard, já está em pesquisas com o objetivo de excluir a
proteína do glúten das culturas de trigo. Isso seria de fundamental importância
para minimizar esse mal crescente. Além disso, a biotecnologia
proporcionou avanços nos bioprocessos também, e vem proporcionando o aumento da
oferta de produtos livres de lactose graças ao uso de enzimas de lactase na
produção.
Portanto, com base em diversas
fontes, é possível afirmar que transgênicos não causam o tipo de mal
relatado na reportagem nem qualquer um outro. Afinal, são mais de 30 anos do surgimento da tecnologia,
com inúmeras análises do risco, totalizando mais de 1700 artigos em uma década,
e um rígido controle e avaliação de risco por parte dos órgãos de regulação. Além
disso, os produtos transgênicos já estão na casa do consumidor brasileiro há
muito tempo, com o exemplo do óleo de cozinha feito a partir da soja
transgênica e os salgadinhos, que vêm do milho transgênico. Então é possível se
tranquilizar quanto a presença de transgênicos na alimentação, pois não há nada
que indique malefícios à saúde.
Salgadinho à base de milho e soja transgênicos |
Óleo à base de soja transgênica |
Caso queira fazer uso dessas
fontes, disponibilizamos aqui a lista com os mais de 1700 artigos, as
principais fontes utilizadas no texto e uma entrevista com a Diretora Geral do
Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) publicada na revista Forbes.
Link da lista:
Artigo da Universidade de Harvard
Entrevista com Kate Hall,
Diretora Geral da CIB
European Commission. (2010). A
decade of EU-funded GMO research (2001–2010). Luxembourg, Publications Office
of the European …. http://doi.org/doi
10.2777/97784
DeFrancesco, L. (2013). How safe
does transgenic food need to be? Nat Biotech, 31(9), 794–802. JOUR. Retrieved
from http://dx.doi.org/10.1038/nbt.2686
Nicolia, A., Manzo, A., Veronesi,
F., & Rosellini, D. (2013). An overview of the last 10 years of genetically
engineered crop safety research, 8551, 1–12. http://doi.org/10.3109/07388551.2013.823595
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